sexta-feira, 18 de julho de 2008

Delicadezas poéticas...



















No dia 16 de Julho, a Carmo Cruz (Avó Pirueta) acordou a apetecer-lhe Drummond de Andrade. Belo acordar e belo apetecer, e logo com um dos poemas mais intensos e belos deste grandioso mineiro, “fazendeiro do ar” como lhe chamou um não menos grande Manuel Bandeira. Sem ela saber, bela prenda de anos a sua leitura!


Hoje acordei eu, a apetecer-me dois poemas de um poeta, em que se imiscuiu outro. Não sei porquê, mas amanheci “doce e delicado e afectivo” à medida da imagem que pareço transparecer. Em boa hora!
Um poeta gigantesco , uma harpa lírica das mais extraordinárias que tocou na poesia portuguesa contemporânea e de todos os tempos. Sena, Jorge de Sena.


Sena nunca conheci, mas o outro, conhecia-o de vista, olhava-o jovem estudante universitário, na sua saga de escrita de café, no ainda hoje vivo Café Diplomata, perto da Livraria Leitura, sem nunca ter tido coragem de lhe falar, porque o endeusamento do respeito por um poeta, criava a barreira do humano do poeta, e com vergonha, pouco conhecia da sua poesia,atarefado que andava por Sebastião da Gama, Torga, Pessoa, Sá-Carneiro e outras grandiosidades de lista de leitura, aprendiz de feiticeiro que ambicionava construir-me. Havíamos de nos cruzar, também sem lhe falar, mas agora extasiado com o seu dom de palavra, com a capacidade de transmitir amor e paixão à poesia. Assim, mais tarde já jovem professor, nos idos anos 80, foi com felicidade que com um grupo de colegas conseguimos trazer o afável e belíssimo poeta, Luís Veiga Leitão à nossa escola. Não para falar da sua obra, mas sim numa humildade que vai rareando nos em “literatos”, na obra de Jorge de Sena. Num período de afectação docente, de descoberta poética, não pude deixar de ficar siderado com a conferência de Veiga Leitão.


Tinha uma ideia de Sena, conhecia uma dúzia dos seus mais publicados poemas desde a “ A carta aos meus filhos sobre os Fuzilamentos de Goya”, passando pelo “Camões dirige-se aos seus contemporâneos”, Estão podres as Palavras”, “A Portugal”, terminando num ou noutro poema da Arte da Música, tinha já lido “O Físico Prodigioso” e, na minha arrogância, ingenuidade dos vinte, achava que sabia alguma coisa do poeta, que estava formada a imagem do tipo de poesia de Sena e até que poderia vislumbrar algo do Homem na pouca obra que conhecia. Verdura de “estagiário” de aprendiz de leitor! Só aos trinta, “Os Sinais de Fogo”, o teatro, e esses monumentos graníticos de classe ímpar para sempre que são o seu “Reino da Estupidez”, os “Estudos de Literatura Portuguesa”, para não falar nesses polémico estudos sobre Camões ou Pessoa, acompanhados pela leitura de artigos sobre o poeta desse apaixonado pela obra de Sena que é Luís Adriano Carlos.


Assim, muito pouco na formatação da ideia da poesia de Sena, que intuía como magnífica, mas algo panfletária, directa, truculenta não raras vezes, mas de um conhecimento cultural imenso e de uma riqueza metafórica e imagética como poucas. Apenas e só semiverdades, porque outro Sena, outros Senas me estavam vedados , ocultos, pela minha inexperiência, conhecimento poético, exiguidade de leituras , ligeireza de análise textual.


Ouvir Luís Veiga Leitão abordar um Sena naturalista, quase floral, vegetativo e sobretudo ligar alguma da sua poesia ao pintura maneirista de Arcimboldo, foi mais do que choque, um deslumbramento. Depois, a própria elaboração discursiva e comparativa de Veiga Leitão, associada a uma poética da linguagem, foi um dos exercícios que jamais esquecerei. A um Sena monolítico, reduzido à essência de uma visão de leitura, começou-me a surgir um Sena poliédrico, multifacetado na sua grandiosidade. Nasceu a paixão até hoje dos Senas, do Sena, da sua poética terna ou truculenta, doce ou azeda, vegetal ou pétrea, mensageira ou de humilde intimismo, de revolta ou de aceitação.


Amo Jorge de Sena e talvez compreenda, embora me custe a aceitar, porque razão este país e esta tão pobre “culturalite” (claramente cultura com celulite) portuguesa ainda não coloque Sena onde ele deveria estar, que algum meio universitário sebenteiro e bafiento ainda olhe desconfiado para a obra maior de Sena ( já não lhes bastava a e o terem ostracizado em vida) e que seja preciso S. Bárbara, ou o Brasil, para Sena ter o que merece! Talvez o início do seu “A Portugal” ainda seja a sua “perdição”

“Esta é a ditosa pátria minha amada.;/Não. Nem é ditosa, porque o não merece./ Nem minha amada, porque é só madrasta./Nem pátria minha, porque eu não mereço/ A pouca sorte de nascido nela./Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta/quanto esse arroto de passadas glórias./Amigos meus mais caros tenho nela,/saudosamente nela, mas amigos são/ por serem meus amigos, e mais nada....

Talvez por isso, ou talvez por outras razões que só os deuses conhecerão, certas vezes alguns poemas de Jorge de Sena gostam de assomar à minha janela do “cá dentro”, poemas cáusticos, rudes, mas mesmo assim de uma delicadeza profunda na sua forma de serem directamente corrosivos. E deixo-os entrar em certos momentos de visitação forçada ao meu eu, de tecnocratas e eurocratas, de engravatados que nos desgovernam, de “caixotins capitaleiros” e ainda por cima de colecção, de corruptos esconsos de esquinas de oportunidade, de massificadores de massas, de acicates de heroísmo e imolação de outros, dos pobres tolos, diabos e afins.
Confesso que neste ano que vai correndo, este Sena, tal como um certo O’Neill, foram-se impondo não raras vezes e Eles lá saberão porquê! Gosto particularmente destes dois poemas, um mais conhecido o outro menos, mas ambos escritos num estado d’alma muito peculiar da vida do poeta, onde companheiros literatos e anões, lhe fartavam de rilhar nos ossos, mas curiosamente ou não, na sua rude, áspera, e vitriólica forma, encontro uma delicadeza extrema. Opiniões, pois! Um aviso: por favor, espíritos pudicos, “Moët Chandons” de raiva, rebentos perto do monitor, fiquem por aqui na leitura desta postagem, porque vêm aí certos “sinais de Sena”.

No País dos Sacanas


Que adianta dizer-se que é um país de sacanas?
Todos os são, mesmo os melhores, às suas horas,
e todos estão contentes de se saberem sacanas.
Não há mesmo melhor do que uma sacanice
para poder funcionar fraternalmente
a humidade de próstata ou das glandulas lacrimais,
para além das rivalidades, invejas e mesquinharias
em que tanto se dividem e afinal se irmanam.

Dizer-se que é de heróis e santos o país,
a ver se se convencem e puxam para cima as calças?
Para quê, se toda a gente sabe que só asnos,
ingénuos e sacaneados é que foram disso?

Não, o melhor seria aguentar, fazendo que se ignora.
Mas claro que logo todos pensam que isto é o cúmulo da sacanice,
porque no país dos sacanas, ninguém pode entender
que a nobreza, a dignidade, a independência, a
justiça, a bondade, etc., etc., sejam
outra coisa que não patifaria de sacanas refinados
a um ponto que os mais não são capazes de atingir.
No país dos sacanas, ser sacana e meio?
Não, que toda a gente já é pelo menos dois.
Como ser-se então nesse país? Não ser-se?
Ser ou não ser, eis a questão, dir-se-ia.
Mas isso foi no teatro, e o gajo morreu na mesma.

(Jorge de Sena)

10/10/1973


RIMAM E DESRIMAM


Rimam e desrimam

- que sabem da vida?

Que aprendem dela

-no que escrevem?


Ah! filhos da puta!


Que sentem ou não sentem

-viveram ou sonharam?

Que ensinam do que viram

- ou nunca imaginaram?


Ah! filhos da puta!

(Jorge de Sena,13/4/1968)



terça-feira, 15 de julho de 2008

o Teu dia...a minha surpresa

Parabéns!

Parabéns por cumprires o teu dever, que o cumpres muito bem...
Parabéns por todas as noites de salvação aos "pai...pai....pai"
Parabéns por todas as chamadas conversas de café "Coisas de Homens" há 1h00

Parabéns por me escutares e compreenderes nos momentos mais complicados
Parabéns por poder confiar em ti como amigo e conselheiro
Parabéns pelas tardes de colégio trocadas pela simplicidade da praia
Parabéns pelas "futeboladas" na areia
Parabéns por seres meu pai

Devo-te Tanto (:

Flávio

quarta-feira, 9 de julho de 2008

BALANÇO em BALANÇA

Cansaço até onde o cansaço deixa de ser cansaço para se tornar quase inacção. O fim de uma acção de supervisão pedagógica , um dia de trabalho de quase oito horas ininterruptas, associadas a outras duas sessões da mesma estirpe no dia 2 e dia 4. Mas apesar de tudo, um arremedo de forças, uma última braçada até à praia-mar aqui para dizer d’Eles e dizer d’Eles, significa dizer algo de mim , no que Eles me deixaram.


A Acção, importantíssima, embora na minha modesta opinião desfasada temporalmente por tardia, foi importantíssima pela reflexão que proporcionou, pelo conhecimento que instilou, pelas incertezas que corrigiu, mas também pelo desassossego que criou. Não fiquei mais sábio, não fiquei melhor Coordenador, nem sei se fiquei mais creditado, todavia uma certeza tenho, mais humano, mais pedagocicamente humilde, mais predisposto à reflexão, à pesquisa, à partilha, ao trabalho solidário e cooperativo, isso fiquei.


A Isabel, como formadora , assertiva, excelente comunicadora, informada, motivadora, lá foi levando a água ao seu e nosso moinho, as/os colegas no geral simpáticos, alguns “duros de roer”, verdadeiros no seu questionar, na tomada de consciência da novidade, na própria dúvida das virtudes do modelo. No fundo gostei e não dei o tempo por mal empregue. Mas...


Gostei muito, mas mesmo muito do meu grupo, das solidariedades ocultas que se criaram, das angústias partilhadas, das experiências trocadas, das humildades assumidas, dos pontos de interrogação traçados, das dores pressentidas aqui e acolá, do diálogo mesmo paralelo, das sinergias espontâneas que se criavam na realização das actividades reflexivas. Mais do que Coordenadores, eramos colegas apanhados na mesma rede de cumplicidades, de questionamentos, de novidades. Naquela CN2, ou nos curtos e intervalares diálogos, as opiniões diferentes, caminhos pedagógicos cruzados ou coincidentes, mas sempre a consciência que alguma coisa nos unia. 25 horas e uns trocos de valer a pena, de gostar de partilhar, da dádiva da humildade, do riso franco e aberto, da preocupação pelo qua aí está e vem, da esperança incerta da experimentação de um modelo. Aprendi imenso com as dúvidas da Isabel, com imersões práticas na realidade do António, da problematização do Rui, o desempoeiramento crítico do Mário, os olhares cúmplices ou desaprovativos da Adelaide. Assim, uma espécie de mosqueteiros da humildade de um por todos e todos por um, que mais do que o sucesso da acção e do grupo, procuramos pontos de encontro de identidade profissional.


Espantoso como nestes encontros, principalmente com colegas de várias “congregações”, conseguimos dialogar, trocar opiniões, experiências, criar laços, se calhar de forma mais simples do que com “os santos da casa”, o que talvez prove a necessidade de mais encontros “congragatórios”, mesmo fora do âmbito de acções de formação, de mais partilhas, de mais proximidade e interacção de conhecimentos, para além das grandes causas, das grandes e pontuais lutas. Como, não sei, mas pressinto que a solidão (in) e (de) docente, anda por aí a tentar-nos, a espartilhar-nos, agora com mais força e denodo, cabendo-nos a sublime luta de a tentar derrotar, sem mártires, sem bandeiras desfraldadas, mas com inteligência, reflexão, afectos solidários. Há quem ache que isto é “sonho” é “conversa fiada”, mas o meu blogue não é para esses, de bílis afiada, de materialismos e objectividades falaciosas, de certezas absolutas, de propostas nítidas nulas prenhes de nada. Essencialmente para mim, o que aqui escrevo, sempre com uma balança do deve e haver afectuoso.


Por isso, para a Isabel, para todos os colegas que comigo estiveram na acção e, sobretudo para o António, o Rui, a Isabel, a Adelaide e o Mário este pequenino clip feito por mim, com fotos minhas, dos rebentos, e música dessa voz magnífica da Matilde Santig. O Título ...já sabem!


Beautiful people
you live in the same world as I do
but somehow I never noticed
you before today
I`m ashamed to say
Beautiful people
we share the same back door
and it isn`t right
we never met before
but then
we may never meet again
if I weren`t afraid you`d laugh at me
I would run and take all your hands
and I`d gather everyone together for a day
and when we gather
I`ll pass buttons out that say
Beautiful people
then you`d never have to be alone
`cause there`ll always be someone
with the same button on as you do
include him in everything you do
Beautiful people
you ride the same subway
as I do ev`ry morning
that`s got to tell you something
we`ve got so much in common
I go the same direction that you do
so if you take care of me
then I`ll take care of you
Beautiful people
never have to be alone
`cause there`ll always be someone
with the same button on as you
include her in everything you do
she may be sitting right next to you
she may be beautiful people too
so if you take care of her
maybe I`ll take care of you